Parabéns mamãe, seu projeto de homem feliz deu certo!*
A última noite de loucura usando as drogas que o levava para uma outra
atmosfera e o tirava do mundo real. A sensação de liberdade que aquelas
substâncias lhe causava era muito maior do que a vontade de permanecer “limpo”
por mais de 12 horas do seu dia. Após a longa jornada um prato de comida era
oferecido pela sua mãe e um repouso tranquilo era o que o esperavam. Mas o sono foi interrompido por dois homens e
duas mulheres que o seguravam. Era de fato a última noite de loucura.
Prelúdio
O sorocabano Gustavo Pasquini nasceu em 1991 com muita predisposição ao
vício. Presenciou o pai chegar em casa muitas vezes alcoolizado. Aos seis anos
viu a mãe se separar desse que tinha o papel de protegê-lo e nunca mais o viu.
A mãe casou-se novamente e o padrasto também carregava vícios. Agora o homem
que substituiu a figura de pai na sua vida, além de beber, fumava maconha e era
uma pessoa violenta. A mãe, batalhadora, não aguentou a carga de ter um segundo
companheiro viciado se separou e, ao voltar para pegar suas coisas, o ex-marido
vendeu todos os seus pertences no ponto de droga mais perto e fumou todo o
dinheiro conquistado em crack.
Viveram por alguns anos com a avó materna até a vida se estabilizar. A
mãe, em parceria com o tio, começou a escrever uma revista sobre a cultura
local de Sorocaba, cidade que fica a 100 km da capital paulista. Após o sucesso
montou uma editora e viajou para muitos lugares do mundo. Isso dava total
liberdade para Gustavo ser dono de sua vida. Deixado aos cuidados de empregadas
e da avó, quando sua mãe se ausentava, aos 13 anos ele experimentava cigarro,
bebidas e um pouco de maconha. A vida que seguia caminhava para o declínio.
Começou a trabalhar com a mãe na editora, repetiu muitas vezes de ano, porque
não ia a aula para usar maconha com os amigos e aos 16 anos decidiu parar a
escola no segundo colegial.
Nessa época o uso da droga foi aumentando. 25gramas de maconha duravam
três dias. Os amigos começaram a mudar e os locais que frequentavam também. Fez
amizade com os hippies do centro da cidade, aprendeu a fazer artesanato, e
conheceu Fabíola, a mulher que virou sua vida de ponta cabeça. Esqueceu os
antigos amigos, começou a cheirar cocaína, aumentou a dose de álcool e maconha.
Com Fabíola, Gustavo viajava para outras cidades para buscar drogas, distribuía
para os traficantes de Sorocaba e região e, claro, pegava uma boa comissão em
cocaína e maconha. Para ajudar no orçamento fazia pequenos delitos de fraude
com cheques, chamado 171.
Sorocaba começou a ficar pequena e com a namorada, seguidos pela
filosofia “um amor e uma cabana”,
partiram para o centro da capital do Estado, São Paulo. Na famosa
esquina da Ipiranga com a São João, no centro da cidade, vendia os artesanatos
e dormiam nos bancos da praça. Dependiam da ajuda das pessoas para comer e
tomar banho. Nunca parou de usar droga, e agora tinha uma parceira, Fabíola era
muito mais viciada que Gustavo e muitas vezes os dois trocavam artesanatos por
drogas. Viviam como nômades. Quando cansavam de uma região, partiam para outra
cidade. Conheceram muito municípios do interior de São Paulo e Rio de Janeiro.
Aos 18 anos ele decide que gostaria de dar um rumo na sua vida. Volta
para a cidade da namorada, Americana, aluga uma pensão, arruma um bom emprego
de torneiro mecânico e a vida sonhada dura 3 meses. O emprego não resistiu ao
uso desenfreado de drogas. Partiram de novo em uma jornada pela estrada, mas
agora Fabíola decidiu levar os filhos. Vendiam artesanatos, faziam novos amigos
e usavam muitas drogas, na frente das crianças. Não resistiram a aventura e
voltaram para Americana. Mas agora Gustavo tinha outra companhia: o crack. Aos
19 anos iniciou o uso da droga mais viciante de todas as drogas. Fabíola já
usava a substância antes que ele e o namoro não resistiu a tanta intensidade.
Sem avisar Fabíola, pega suas poucas coisas e volta pra casa da mãe que
sabia de longe sobre a vida que o filho decidiu levar. Por um mês tentou se
manter com o ofício de artesão. Mas a droga já o consumia, e sua aparência já
dava sinais de decadência. Quando vendeu o celular do irmão para comprar drogas,
a mãe tomou uma decisão com a tia: internar Gustavo. A última noite no ápice da
loucura usando as drogas tinha chegado. Após a longa jornada um prato de comida
e um repouso tranquilo era oferecido pela sua mãe que esperou o jovem pegar no
sono, chamou a ambulância, dois homens e duas mulheres o seguravam e Gustavo
foi internado involuntariamente.
Rehab
Ao todo a internação durou 1 ano. A mãe fez um empréstimo para custear
todos os gastos. A clínica abrigava 45 homens igualmente ou mais viciados, 10
seguranças que vigiavam os internos por 24 horas, 5 conselheiros e nenhuma
chance de fugir do lugar. Com regras rígidas e acompanhamento constante,
Gustavo conseguiu suportar os três primeiros meses, que ele julga serem os mais
difíceis. A pior hora era na hora de dormir quando toda a sua vida passava como
em um filme na sua cabeça e o arrependimento de ter aproveitado mal a sua
liberdade. A leitura da Bíblia e as conversas de grupo diárias o ajudou a se
auto perdoar e entender a sua doença. Que parar de usar droga não é um ato tão
simples, mas assim como ele mesmo começou, ele pode dar um basta na situação de
degradação da sua vida. Após quatro
meses de internação, e se o interno tiver bom comportamento, é lhe dado o
direito a um final de semana com a família. Gustavo fez com sucesso. No sétimo
mês de rehabilitação Gustavo ganhou a oportunidade de trabalhar na clínica como
segurança. Quando acabou o tratamento ele continuou prestando serviços para o
local durante dois meses agora com um salário mensal de R$ 600.
Próximo passo
Como sempre gostou de cozinhar, Gustavo se interessou por um curso de
gastronomia no Senac de Juíz de Fora, Minas Gerais. Conversou com os familiares
e com o dinheiro que ganhou trabalhando na clínica se mudou para a cidade.
Conquistou diversos trabalhos, trabalhou um restaurante local, aumentou a
clientela do estabelecimento até ser descoberto por um refinado bistrô da região. Nesse lugar teve a
certeza do que queria para a vida. Com um salário mensal de R$ 1.500 aprendeu
com um importante chef a arte da
culinária. Nesse momento despertou a vontade de morar fora do país, aprender
inglês, e aprimorar a técnica na cozinha.
Futuro
Em 2012 chegou na Irlanda. Trabalhou como Kitchen Porter e há nove meses
é rickshaw pelas ruas de Dublin. Como não podia ser diferente, conheceu uma mulher
mais velha, mas agora com outra realidade. Com ela embarca em janeiro para a
Tailândia e dará início a segunda parte do seu projeto inicial pós rehab.
Aprimorar as técnicas de chef de cozinha para voltar ao Brasil em condições
melhores. Fará um curso de seis meses em uma das mais reconhecidas rede
internacional de culinária francesas, Le Cordon
Bleu. Está quatro
anos sem beber ou usar drogas e sabe que o sucesso é só por hoje.
*O
título é parte da música A Cada Vento do Emicida
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